domingo, outubro 29, 2006

Estranho


Todas as pessoas são diferentes umas das outras.
Cada uma tem a sua maneira de ser e de agir.

No entanto, quando olho para as outras pessoas tenho sempre tendência a achar que elas são como eu.
Que pensam como eu, que têm as mesmas reacções que eu.

E isso faz com que eu tenha determinadas expectativas em relação a elas, que na maioria dos casos nunca são atingidas...
Isto porque eu exigo muito de mim própria e, no fundo, acabo por também exigir muito dos outros.

Ponho sempre as pessoas num patamar muito elevado e são raras aquelas que realmente conseguem corresponder ao nível em que eu as ponho.

Ou seja, as outras pessoas tendem a ser uma constante desilusão para mim... não por culpa delas... cada um é como é...
A culpa acaba por ser minha, porque espero demasiado delas.

E a parte estúpida de tudo isto, é que eu já devia saber que é assim que funciona e já não devia ter expectativas em relação aos outros.
E na maior parte dos casos é assim. Mas...

... mas de vez em quando aparece alguém, que parece diferente dos restantes, que se parece mais comigo.

E nessas alturas, eu volto a acreditar que essa pessoa pode corresponder às minhas expectativas e pode "cumprir" aquilo que eu espero dela... e, normalmente, volto a enganar-me... é simplesmente mais uma desilusão...

Não sei... provavelmente sou eu que tenho os meus padrões de exigência muito elevados...

Eu bem sei que não é muito fácil lidar comigo e muito menos compreender-me... mas também não tenho uma maneira de pensar assim tão esquisita quanto isso!

Alguém me disse um destes dias que eu sou uma pessoa estranha.
Já me tinham chamado muita coisa antes, mas estranha nunca foi uma delas...
Mas pensando bem no caso, até é uma definição adequada... e além disso, eu acho piada! ;)

E, sendo assim, acho que vou esperar que apareça alguma mente estranha parecida com a minha.
Só mesmo alguém estranho como eu é vai conseguir estar ao nível de "estranhez" que eu espero das pessoas...

domingo, outubro 22, 2006

Lei da Rotatividade


Eu tento não me afeiçoar demasiado às pessoas. Porque elas entram na nossa vida, fazem parte dela e depois desaparecem...

Conhecemos alguém, começamos a ter contacto com essa pessoa, a conhecer essa pessoa. Ela passa a fazer parte do nosso dia a dia.

Começa por ser apenas um conhecido, um colega... depois passa a ser um amigo, alguém que está lá para nós e que nos faz companhia...
E nós afeiçoamo-nos a essa pessoa. Gostamos dela, da companhia dela, habituamo-nos a ela....

E eis senão quando ela desaparece... E todas elas desaparecem!

Deve haver um qualquer sistema de rotatividade entre os conhecidos e amigos, porque estamos sempre a fazer novos amigos e a "deixar" amigos antigos.
E todos nós fazemos isso. É tipo uma lei da Natureza.

Mas por um lado esta rotatividade é óptima!
Pessoas novas, com mentes frescas, que não conhecem os pressupostos pelos quais nós nos regemos a nós próprios.
Pessoas que não conhecem os nossos problemas e não os vivem connosco e que, por isso, nos conseguem fazer esquecê-los, nos conseguem fazer relaxar, esvaziar a cabeça e encarar as coisas de outra maneira.

E estas pessoas fazem-nos tão bem que nós nos afeiçoamos a elas. E depois, quando chega a altura de irem embora... não é fácil!

Mas nós sabemos que, pela "Lei da Rotatividade", novas pessoas virão. Novos conhecidos, novos amigos, novas mentes frescas, que nos farão esquecer as anteriores...

Mas enquanto não chegam, restam-nos as saudades dos que estão de saída... resta-nos agradecer o tempo em que foram nossos amigos... resta-nos desejar que encontrem novos amigos, bons amigos...

Por isso, é que eu tento não me afeiçoar demasiado às pessoas. Porque elas entram na nossa vida, fazem parte dela e depois desaparecem...

domingo, outubro 15, 2006

Pensamento da Semana


Monotonizar a existência, para que ela não seja monótona.

Tornar anódino o quotidiano, para que a mais pequena coisa seja uma distracção.

No meio do meu trabalho de todos os dias, baço, igual e inútil, surgem-me visões de fuga, vestígios sonhados de ilhas longínquas, festas em áleas de parques de outras eras, outras paisagens, outros sentimentos, outro eu.

Mas reconheço, entre dois lançamentos, que se tivesse tudo isso, nada disso seria meu.

Mais vale, na verdade, o patrão Vasques que os Reis do Sonho; mais vale, na verdade, o escritório da Rua dos Douradores do que as grandes áleas dos parques impossíveis.

Tendo o patrão Vasques, posso gozar a visão interior das paisagens que não existem.

Mas se tivesse os Reis do Sonho, que me ficaria para sonhar?

Se tivesse as paisagens impossíveis, que me restaria de possível ? (...)

Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada.

Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar.

O ajudante de guarda-livros pode sonhar-se imperador romano; o Rei de Inglaterra não o pode fazer, porque o Rei de Inglaterra está privado de o ser, em sonhos, outro rei que não o rei que é.

A sua realidade não o deixa sentir.


Fernando Pessoa, in 'Livro do Desassossego'

domingo, outubro 08, 2006

Pensamento da Semana


Admiro os viciados.

Num mundo em que está toda a gente à espera de uma catástrofe total e aleatória ou de uma doença súbita qualquer, o viciado tem o conforto de saber aquilo que quase de certeza estará à sua espera ao virar da esquina.

Adquiriu algum controlo sobre o seu destino final e o vício faz com que a causa da sua morte não seja uma completa surpresa.

De certo modo, ser um viciado é uma coisa bastante proactivista.

Um bom vício retira à morte a suposição.

Existe mesmo uma coisa que é planear a tua fuga.


Chuck Palahniuk, in 'Asfixia'

domingo, outubro 01, 2006

Pensamento da Semana


Não é preciso proibir aquilo a que nenhuma alma humana aspira.

É precisamente o modo como está formulada a proibição: «Não matarás», que é de molde a dar-nos a certeza de descendermos de uma série infinitamente longa de gerações de assassinos, que possuíam no sangue, talvez como nós próprios, a paixão de matar.


Sigmund Freud, in 'As Palavras de Freud'